quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

O carro número 2173: gentilezas


Nessa segunda-feira, presenciei uma rara cena nesses tempos modernos.

De manhã, perdi a hora de acordar e sai de casa atrasado para o trabalho. Esperei pelo ônibus* e para minha sorte não demorou. Peguei o Stiep Vale dos Rios - R4, carro número 2173.

O "carro", como o povão chama, seguiu seu caminho, entrou na rua da Tv Itapoan e parou quando iniciava a descida da ladeira Rua Durval Moraes (uma ladeira) que leva até a Rua Sérgio de Carvalhoo, ou muito mais conhecida como "vale das muriçocas".

O motorista parou e puxou conversa com uma pessoa que estava do lado de fora que não vi quem era. A pessoa respondeu. Ele perguntou com o tom de voz mais alto, mas de forma calma e paciente se a pessoa não queria ajuda para descer a ladeira; se não queria carona.

Nesse momento, imaginei alguma mocinha pela qual o motorista poderia está paquerando, mas para minha surpresa não; era uma senhora de aparência simples e humilde, com seus cabelos grisalhos pelos muitos anos de vida.

Ela falou algo ao motorista, como que recusasse ou que não precisaria tanto trabalho, mas o motorista insistiu pelo menos mais duas vezes novamente com tom sereno e calmo, que não precisava pressa; que ele esperava, até que ela decidiu por entrar.

Foi nesse que percebi que a senhora não estava sozinha. Ela estava acompanhando e auxiliando um senhor, também de idade, aparentando um pouco mais cansado da vida, com cabelos tão grisalhos quanto e muito mais escassos que o dela. Ele lentamente e sem pronunciar som algum, se aproximou mais da escada, se curvou, apoiou subiu com uma muleta o primeiro degrau e tão lentamente quanto a primeira vez, subiu o segundo e se ajustou à cadeira e sentou com apenas uma perna.

Apesar da "demora", o motorista aguardou e também nenhuma pessoa presente no ônibus ou mesmo os dois ou três carros que aguardaram fizeram qualquer gesto de impaciência.

A senhora subiu logo atrás do senhor segurando a muleta e o ônibus seguiu o caminho.

Novamente gentil, o motorista perguntou para onde eles iriam e à menos de 150 metros, fora do ponto, parou para que descessem. Avisou que não precisava pressa que ele aguardava sem problemas.

A senhora agradeceu, desceu e auxiliou o senhor que se curvou, apoiou, desceu um a um, os degraus, até parar na calçada.

O motorista acenou e seguiu o rumo. No ônibus, em total silêncio, sentir como se não fosse o único que havia se orgulhado com as gentilezas.

Cena que devo relembrar por um bom tempo.

* Sim, eu ainda pego ônibus, mas por pouco tempo.